Saber o que são doenças autoimunes e como elas se manifestam no organismo pode ser um diferencial importante na busca por diagnósticos. É comum que existam dificuldades nas avaliações médicas, devido ao amplo grupo de doenças que são consideradas autoimunes.
Os sintomas dependem de vários fatores, como o tipo de região acometida, o grau de evolução da doença e a idade de cada paciente. Por isso, é tão importante conhecer, ao máximo, o próprio corpo e ter atenção especial a qualquer sinal suspeito ou comprometimento da qualidade de vida.
Neste artigo, vamos explicar o que são doenças autoimunes, listar seus principais exemplos e as possibilidades de prevenção. Para isso, contamos com a colaboração do Dr. Wilton Ferreira Silva Santos, reumatologista do Grupo Sabin. Acompanhe!
O que são doenças autoimunes?
Existem inúmeras doenças imunológicas, acompanhadas por diferentes especialistas da área da saúde. Portanto, o termo “doenças autoimunes” é bastante abrangente. Ele diz respeito a um grupo diverso de doenças, nas quais o sistema imunológico, responsável por defender o organismo contra agentes invasores, passa a atacar o próprio corpo.
O resultado é uma série de sintomas desencadeados pelo comprometimento das estruturas atacadas pelo sistema imunológico.
Como as doenças autoimunes são classificadas?
As doenças autoimunes dependem muito de qual órgão está sendo agredido. São divididas, geralmente, em duas categorias. Confira o que diz o entrevistado:
“Existe uma classificação na literatura, as doenças autoimunes órgão-específicas, que acometem determinado órgão ou estrutura, e as não órgão-específicas, que agridem o indivíduo como um todo. Em linhas gerais, nas órgão-específicas, a pessoa com doença autoimune será tratada pela especialidade médica que lida com aquele órgão agredido. Já no caso das não órgão-específicas, os cuidados são conduzidos por um reumatologista.”
Entre as doenças órgão-específicas, podemos citar como exemplos:
- a tireoidite de Hashimoto, na qual os anticorpos atacam a glândula tireoide, diminuindo a produção dos hormônios tireoidianos;
- as hepatites autoimunes, que causam inflamação e alterações funcionais do fígado;
- a miastenia gravis, na qual os anticorpos agridem a junção neuromuscular, causando fadiga e fraqueza muscular;
- a esclerose múltipla, em que o organismo do paciente passa a atacar a proteção dos nervos, ocasionando dificuldades na comunicação entre o cérebro e o corpo, além de uma série de alterações neurológicas;
- o pênfigo, no qual os anticorpos produzidos pelo paciente agridem a pele, ocasionando bolhas cutâneas.
Como comprometem um órgão ou sistema específico, essas doenças são tratadas pelos especialistas responsáveis pelos órgãos afetados.
As doenças autoimunes não órgão-específicas costumam acometer múltiplos órgãos e sistemas, tendo uma multiplicidade de apresentações clínicas e, por essa razão, o médico mais indicado para o manejo e cuidado com o paciente é o reumatologista.
Quais são as doenças autoimunes mais conhecidas?
Há muitos quadros de doenças autoimunes, com variações de sintomas e manifestações, já que dependem do órgão afetado em cada caso específico. Fatores como gravidade da doença, estilo de vida e idade do paciente também podem camuflar ou agravar os sinais.
Veja, a seguir, algumas das doenças autoimunes mais conhecidas, seus sintomas e tratamentos.
Lúpus eritematoso sistêmico
O lúpus é rico em sintomatologia e em mecanismos de agressão. Aqui, as células de defesa atacam células saudáveis do corpo, provocando inflamações em várias partes dele. Entre os principais órgãos afetados, estão a pele, as articulações, os rins, o cérebro, o coração e os pulmões.
De acordo com o especialista, não existe cura para a doença. Contudo, ele destaca que existem diversas propostas de tratamento, cujo objetivo é o controle da doença. A modalidade de tratamento a ser escolhida depende da manifestação clínica a ser tratada. Devido ao papel da exposição à luz solar no desencadeamento e reativação da doença e a influência negativa do sedentarismo na longevidade e qualidade de vida dos pacientes, o uso de protetor solar e a prática de atividade física supervisionada são recomendados. O uso de analgésicos, anti-inflamatórios, corticoides, imunomoduladores e imunossupressores deve ser indicado caso a caso.
Muitos testes laboratoriais podem auxiliar no diagnóstico do lúpus. A detecção de alterações imunológicas nos exames é essencial para o correto diagnóstico da doença. E alguns testes laboratoriais também podem ser utilizados para predizer a evolução do paciente, sendo muito úteis na prática clínica diária.
Artrite reumatoide
A artrite reumatoide figura como uma das doenças crônicas autoimunes sistêmicas mais prevalentes, atingindo cerca de 1% da população mundial. Diferentemente do lúpus, ela tem como alteração principal o comprometimento articular, que costuma ser mais frequente, intenso e destrutivo. Tem início entre os 30 e 40 anos, sendo mais prevalente no sexo feminino.
Os sintomas são decorrentes da inflamação das juntas. E envolvem dor, calor, inchaço e vermelhidão, que podem aparecer em todas as articulações do corpo, mas especialmente nos punhos, mãos e pés.
Em decorrência da inflamação das juntas, os pacientes se queixam de fadiga e rigidez de movimentos, predominantes no período da manhã. A progressão da doença pode provocar a destruição da cartilagem articular.
Do ponto de vista laboratorial, a artrite reumatoide se caracteriza pela presença de dois marcadores imunológicos: o fator reumatoide; e os anticorpos antipeptídeos citrulinados cíclicos (anti-CCP), que fazem parte dos seus critérios de classificação e são itens importantes para o diagnóstico da doença.
Espondilite anquilosante
A espondilite anquilosante compõe o grupo das espondiloartrites e se caracteriza pelo acometimento da coluna e da articulação entre o sacro e o osso ilíaco do quadril, denominada sacroilíaca.
A doença também cursa com manifestações extra-articulares, podendo atingir olhos, coração, rins e intestinos. O diferencial em relação às outras doenças autoimunes é que a espondilite anquilosante atinge mais homens do que mulheres. Os quadros costumam surgir a partir da adolescência, até a faixa dos 40 anos de idade. Para que não se torne incapacitante, diagnóstico e tratamento precoces são fundamentais.
A pesquisa do antígeno HLA-B27 é um recurso laboratorial que pode auxiliar no diagnóstico da espondilite, uma vez que cerca de 70% dos pacientes brasileiros apresentam o teste positivo. Além disso, pacientes de espondilite HLA-B27 positivos são mais propensos a apresentar manifestações extra-articulares da doença e, portanto, formas mais sistêmicas e de pior prognóstico. Marcadores inflamatórios estão alterados em cerca de metade dos pacientes.
Síndrome de Sjögren
Doença autoimune que acomete glândulas exócrinas em diversos tecidos, sendo mais frequente o comprometimento das glândulas lacrimais e salivares. Em decorrência disso, os pacientes apresentam quadro de secura nos olhos e na boca, sintomas mais característicos da síndrome.
Mulheres entre 40 e 60 anos de idade são as mais frequentemente acometidas. A doença pode aparecer de forma isolada ou vir em associação com outra doença autoimune. Assim, durante o processo de investigação desse grupo de doenças, é preciso estar sempre atento para um possível diagnóstico de síndrome de Sjögren. Além da secura ocular-oral, os pacientes podem apresentar secura na pele, nariz e órgãos genitais, bem como sinais de envolvimento pulmonar, renal, cerebral, cutâneo e vascular.
De acordo com o entrevistado, exames de sangue, de imagem e histopatológico podem dar suporte ao diagnóstico de síndrome de Sjögren. Entre os exames de sangue, destaca-se a dosagem de autoanticorpos, cuja presença reforça a causa imunológica dos sintomas relatados pelos pacientes. A avaliação de um oftalmologista também está indicada para uma melhor definição do comprometimento ocular causado pela doença.
É possível se prevenir contra doenças autoimunes?
As doenças autoimunes não têm uma causa definida. Seu desenvolvimento é resultado de fatores genéticos, ambientais e hormonais. A hereditariedade tem uma contribuição importante, uma vez que a maioria delas apresenta uma agregação familiar.
“Entre os fatores de risco ambientais para o desenvolvimento de doenças autoimunes, temos o tabagismo, exposição a raios ultravioleta, pó de sílica, mercúrio, implantes de silicone, agentes infecciosos e o uso de alguns medicamentos”, explica Dr. Wilton.
Segundo ele, a maioria das doenças reumáticas autoimunes predomina no sexo feminino, sugerindo um possível papel dos hormônios sexuais no desencadeamento das mesmas. Os hormônios sexuais têm efeito modulador sobre a resposta imune, interferindo com a resposta inflamatória. É válido ressaltar, porém, que a influência estrogênica ou androgênica na patogênese das doenças imunológicas não é absoluta, uma vez que doenças autoimunes ocorrem também em homens com perfil hormonal normal.
Alguns estudos conduzidos em indivíduos pré-sintomáticos, ou seja, antes de apresentarem sintomas de doença autoimune, mostram que a presença de autoanticorpos no sangue antecede, em muitos anos, as manifestações clínicas de autoimunidade, indicando um possível papel patogênico desses anticorpos na transição para a fase sintomática.
Dessa forma, a prevenção das doenças reumáticas autoimunes deve levar em consideração a não exposição aos fatores de risco, mencionados anteriormente. Isso deve ser enfatizado principalmente em indivíduos geneticamente suscetíveis, que apresentam autoanticorpos ligados às doenças autoimunes, mesmo aqueles assintomáticos.
Sabendo o que são doenças autoimunes e como elas agem no organismo, vale reforçar que é indispensável procurar auxílio médico ao notar qualquer sintoma persistente, seja qual for sua origem. Com tratamento adequado, lidar com um quadro autoimune se torna muito menos complicado e ajuda a manter a qualidade de vida do paciente.
Que tal aproveitar a leitura e aprender mais sobre as principais doenças crônicas existentes? Conhecimento nunca é demais!