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Saúde de jovens e adolescentes: os impactos da adultização

Efeitos da adultização na saúde de jovens e adolescentes

A adultização precoce de crianças e adolescentes é um fenômeno que tem gerado crescente atenção por parte de especialistas, educadores, famílias e instituições públicas. Esse processo, impulsionado em grande parte pelas redes sociais e pela exposição midiática, antecipa experiências e comportamentos adultos em indivíduos que ainda estão em formação, muitas vezes os privando de vivências fundamentais da infância.

Entre os principais sinais, estão a sexualização precoce, a imposição de responsabilidades emocionais e sociais incompatíveis com a idade e o incentivo ao consumo e à estética adulta. Esse cenário afeta diretamente o desenvolvimento emocional e psicológico de jovens, podendo resultar em transtornos de saúde mental e dificuldades na construção da identidade.

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) tem se posicionado ativamente sobre o tema e foi uma das entidades que apoiou a aprovação do PL 2628/2022, também conhecido como o “PL da adultização”, que busca regulamentar o ambiente digital e proteger crianças e adolescentes de exposições indevidas. A campanha de tolerância zero contra crimes virtuais é outro exemplo da urgência desse debate.

No conteúdo de hoje, traremos atualizações importantes sobre o tema para pais, cuidadores e todos que se preocupam com a infância. Continue a leitura para saber mais!

O que é adultização e como ela se manifesta?

A adultização é o processo em que crianças e adolescentes passam a ser tratados, percebidos ou se comportam como adultos antes do tempo. No ambiente digital, esse fenômeno é amplificado pela superexposição em redes sociais, onde meninas são frequentemente sexualizadas ou cobradas por atitudes e aparências adultas.

Esse tipo de antecipação inclui não apenas questões estéticas, mas também emocionais e comportamentais. Crianças passam a ter responsabilidades que não condizem com sua idade ou são expostas a temas e experiências adultas, como relacionamentos, consumo de moda, padrões corporais e até debates políticos e sociais complexos.

A literatura científica destaca que, nas redes sociais, o processo é ainda mais acelerado, dado o contato constante com conteúdos voltados para adultos e a ausência de filtros eficazes por parte das plataformas. 

Nesse sentido, a SBP e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) alertam para os riscos dessa exposição, reforçando que a infância é uma fase protegida por lei e que deve ser preservada com prioridade absoluta.

Quais são os impactos da adultização na saúde mental e no desenvolvimento?

Os efeitos da adultização precoce podem ser amplos e profundos, atingindo diretamente a saúde mental e o desenvolvimento neurocognitivo. 

Crianças e adolescentes expostos a esse tipo de experiência estão mais propensos a desenvolver sintomas de ansiedade, depressão, baixa autoestima, transtornos de comportamento e dificuldades na formação da identidade.

Alguns estudos apontam que experiências precoces de sexualização, exposição a padrões estéticos irreais e responsabilidades emocionais intensas podem levar a traumas psicológicos. O fenômeno está associado a um aumento na vulnerabilidade social e à dificuldade de adaptação em ambientes educacionais, familiares e sociais.

Esses efeitos podem ser explicados pela maior sensibilidade do cérebro infantil a estímulos ambientais adversos, como indica o conceito de “exposome”. Durante a infância e a adolescência, o sistema neurológico está em fase de amadurecimento, sendo especialmente vulnerável a pressões externas e sobrecargas emocionais. Assim, a convivência com situações de adultização pode prejudicar conexões neurais, impactar habilidades cognitivas e comprometer a saúde mental ao longo da vida.

Redes sociais e a exposição precoce: quais os riscos?

As redes sociais têm se tornado um dos principais vetores da adultização precoce. O fácil acesso a conteúdos impróprios, a busca incessante por validação, por meio de curtidas e seguidores, e a presença em plataformas que priorizam a imagem e o engajamento podem distorcer a percepção que crianças e adolescentes têm de si mesmos e do mundo.

Os riscos mais graves envolvem o contato com práticas como grooming (aliciamento), sexting, sextorsão, pornografia infantil, manipulação de imagens com deep fakes e exposição a discursos de ódio ou violência. A presença de crianças em redes antes da idade permitida, incentivada pelos próprios responsáveis por diversas ocasiões, amplia essa vulnerabilidade.

O componente parental é, em diversos casos, falho ou inexistente, e as plataformas digitais não têm adotado medidas eficazes para impedir o acesso a conteúdos inadequados. Dessa forma, o ambiente digital, sem regulamentação rígida, torna-se terreno fértil para práticas que desrespeitam os direitos essenciais da infância.

O papel da legislação: o que muda com o PL 2628/2022?

O PL 2628/2022 surge como uma resposta legislativa à crescente preocupação com a exposição digital de crianças e adolescentes. Aprovado pela Câmara dos Deputados, o projeto propõe regras claras para a atuação das plataformas digitais, obrigando-as a adotar mecanismos de verificação de idade, limitar a publicidade voltada a menores e prevenir o acesso a conteúdos nocivos.

Entre os pontos centrais, destacam-se a responsabilização das empresas em casos de violação, a criação de uma autoridade autônoma de fiscalização e a previsão de sanções que incluem advertências, multas, suspensão e até proibição de atuação em território nacional.

Importante ressaltar que o projeto não busca censurar conteúdos, mas proteger os direitos de crianças e adolescentes, reforçando o que já está previsto no ECA. Trata-se de garantir que o ambiente digital seja seguro, respeitoso e adequado ao desenvolvimento das novas gerações.

Adultização além das telas

Embora o foco atual esteja na internet, a adultização de crianças e adolescentes também ocorre em contextos offline. A inserção precoce no mercado de trabalho, a necessidade de cuidar de irmãos ou assumir tarefas domésticas em excesso e a ausência de uma rede de apoio familiar configuram formas silenciosas de antecipar a vida adulta.

Esses casos, geralmemente associados à pobreza, negligência e desigualdade social, retiram das crianças o direito de viver a infância em plenitude. A chamada parentificação, quando a criança assume o papel de cuidadora, pode gerar sobrecargas emocionais, prejuízos na formação da identidade e dificuldades em estabelecer relações saudáveis na vida adulta.

Por isso, é crucial reconhecer e combater a naturalização desses cenários, invisibilizados, na maioria das vezes, sob o argumento de “maturidade precoce” ou de “ajuda necessária em casa”.

Quem são os mais vulneráveis à adultização?

Dados apontam que meninas negras, entre oito e 18 anos, são as principais vítimas do processo de adultização. O cruzamento entre racismo estrutural, sexismo e vulnerabilidade social faz com que esse grupo receba menos proteção institucional, além de serem alvo recorrente de hipersexualização, punições mais severas em contextos escolares e ausência de reconhecimento de sua infância.

Não raramente, essas meninas são vistas como “mais velhas” do que realmente são, tanto por adultos quanto por pares, o que contribui para sua exclusão de ambientes seguros e aumento da exposição a situações de violência, exploração e negligência.

Como prevenir a adultização e proteger crianças e adolescentes?

É preciso que as políticas públicas, os serviços de saúde e educação e a sociedade como um todo adotem uma abordagem interseccional para proteger esses grupos e garantir que seus direitos sejam plenamente respeitados.

Papel das famílias e escolas

A mediação ativa do uso da internet é um dos primeiros pontos para reduzir os riscos da adultização. Famílias e escolas devem promover o diálogo sobre limites, privacidade e uso consciente das redes. Também é relevante que ambientes escolares valorizem a infância, incentivando a autoestima, a expressão emocional e a convivência respeitosa.

Ações do poder público e da sociedade

A regulamentação das plataformas digitais, como propõe o PL 2628/2022, é um passo para garantir ambientes seguros. Além disso, campanhas educativas, fiscalização efetiva e suporte às famílias em situação de vulnerabilidade são medidas urgentes para prevenir a adultização.

Entidades e canais, como o Disque 100 e a SaferNet, são ferramentas significativas para denúncias de violação de direitos.

Cuidados com a saúde mental

O acompanhamento psicológico pode fazer diferença substancial para jovens que vivenciaram situações de adultização. A escuta qualificada, o acolhimento e o cuidado especializado são vitais para prevenir agravamentos e favorecer o desenvolvimento emocional saudável.

É de suma importância que os serviços públicos e as escolas estejam preparados para identificar sinais de sofrimento psíquico e oferecer encaminhamento adequado.

A adultização é um fenômeno cada vez mais presente, e seu enfrentamento exige a participação ativa de famílias, escolas, profissionais de saúde, plataformas digitais e do poder público. Preservar a infância é garantir que crianças e adolescentes cresçam com saúde, segurança e dignidade. 

Para continuar refletindo sobre esse tema e aprender a proteger melhor os jovens na era digital, acesse nosso conteúdo: Redes sociais e adolescentes: como garantir um ambiente saudável.

Sabin avisa:

Este conteúdo é meramente informativo e não pretende substituir consultas médicas, avaliações por profissionais de saúde ou fornecer qualquer tipo de diagnóstico ou recomendação de exames.

Importante ressaltar que diagnósticos e tratamentos devem ser sempre indicados por uma avaliação médica individual. Em caso de dúvidas, converse com seu médico. Somente o profissional pode esclarecer todas as suas perguntas. 

Lembre-se: qualquer decisão relacionada à sua saúde sem orientação profissional pode ser prejudicial.

Referências:

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Brissett, Daniela et al. “Adultification of Young Black Females on Their Health and Well-being: A Qualitative Study.” Pediatrics vol. 155,6 (2025): e2024069110. doi:10.1542/peds.2024-069110

Quayle, Ethel, and Terry Jones. “Sexualized images of children on the Internet.” Sexual abuse : a journal of research and treatment vol. 23,1 (2011): 7-21. doi:10.1177/1079063210392596

Rimer, Jonah R. “”In the street they’re real, in a picture they’re not”: Constructions of children and childhood among users of online child sexual exploitation material.” Child abuse & neglect vol. 90 (2019): 160-173. doi:10.1016/j.chiabu.2018.12.008

Robinson, Heather et al. “The effect of the “exposome” on developmental brain health and cognitive outcomes.” Neuropsychopharmacology : official publication of the American College of Neuropsychopharmacology, 10.1038/s41386-025-02180-6. 5 Aug. 2025, doi:10.1038/s41386-025-02180-6

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