Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que 1,5 bilhão de pessoas em todo o mundo — o equivalente a cerca de um quarto da população mundial — estejam infectadas por algum tipo de parasito intestinal. Entre as principais categorias de parasitos, estão os helmintos transmitidos pelo solo, responsáveis pela maioria dos casos.
No Brasil, a situação não é diferente. Um estudo realizado entre os anos 2000 e 2018 revelou que a prevalência de infecções parasitárias intestinais, causadas por protozoários e/ou helmintos, atingiu cerca de 46% da população. Essa prevalência varia significativamente conforme a região do país, sendo de 37% no Sudeste, 51% no Sul, 50% no Nordeste, 58% no Norte e 41% no Centro-Oeste.
Portanto, é fundamental conscientizar a população acerca dos riscos dessas doenças e como realizar a prevenção. Neste conteúdo, você encontrará informações relevantes sobre as principais parasitoses intestinais, formas de transmissão, diagnóstico, tratamento e como se prevenir. Boa leitura!
O que são parasitoses intestinais?
Parasitoses intestinais são condições médicas ocasionadas pela presença de parasitas no trato gastrointestinal humano. Esses parasitas podem ser de diferentes tipos, incluindo helmintos (vermes) e protozoários. Ao infectar o intestino, podem causar uma variedade de sintomas, incluindo dor abdominal, diarreia, náuseas, vômitos, perda de peso, fadiga e outros problemas gastrointestinais.
As parasitoses intestinais são comumente adquiridas através da ingestão de água, alimentos contaminados com ovos ou cistos, contato com solo contaminado ou pela transmissão de pessoa para pessoa.
Com uma incidência maior em crianças, essas condições representam um desafio para a saúde pública, especialmente em regiões rurais e nas periferias das áreas urbanas de países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, onde, muitas vezes, o acesso ao saneamento básico é limitado ou inexistente. Nesses locais, os parasitas encontram condições ideais para se multiplicarem e infectarem a população.
É importante tratar adequadamente as parasitoses intestinais, pois infecções persistentes podem levar a complicações graves de saúde, incluindo desnutrição, anemia, danos ao intestino e comprometimento do desenvolvimento físico e cognitivo, especialmente em crianças.
Quais os principais tipos de parasitoses?
As parasitoses podem ser causadas por diferentes tipos de parasitos, vermes ou protozoários, sendo transmitidas geralmente pela via fecal-oral. A seguir, apresentaremos em mais detalhes as principais parasitoses e suas características de transmissão. Confira!
Amebíase: Entamoeba histolytica
A amebíase é uma infecção intestinal causada pelo protozoário Entamoeba histolytica. Esse parasita pode ser encontrado em regiões tropicais e subtropicais, sobretudo em áreas onde as condições sanitárias são precárias.
- Transmissão: a principal via de contaminação se dá com a ingestão de água ou alimentos contaminados por fezes contendo cistos de Entamoeba histolytica;
- Diagnóstico: a detecção pode ser feita por meio do exame parasitológico de fezes, no qual é possível observar a presença de trofozoítos (forma ativa do protozoário) ou cistos do parasito presentes em amostras de fezes. Também é possível medir os níveis de anticorpos no sangue e realizar exames de imagem, como ultrassonografia e tomografia computadorizada, que podem ajudar a identificar os abcessos amebianos;
- Tratamento: é feito por meio de medicamentos de acordo com o critério médico, considerando a concentração e a dosagem adequadas. Os remédios normalmente receitados incluem secnidazol, metronidazol, tinidazol, entre outros.
Ancilostomíase: A. duodenale e Necator americanus
A ancilostomíase, também conhecida como “amarelão”, é uma infecção causada por vermes parasitas, sendo os principais agentes causadores o Ancylostoma duodenale e o Necator americanus.
- Transmissão: os ovos presentes nas fezes são liberados no solo, onde passam por um processo de desenvolvimento embrionário. Sob condições adequadas de umidade e temperatura, as larvas se desenvolvem e se tornam capazes de causar infecção. A transmissão para os seres humanos ocorre quando essas larvas infectantes penetram na pele — em geral, através dos pés;
- Diagnóstico: o diagnóstico laboratorial é feito ao encontrar ovos durante o exame parasitológico de fezes;
- Tratamento: medicamentoso com a prescrição médica de mebendazol, albendazol e outros medicamentos similares.
Ascaridíase: Ascaris lumbricoides
A ascaridíase é uma infecção causada pelo verme Ascaris lumbricoides, também conhecido popularmente como “lombriga”. Esse parasita é um dos helmintos mais comuns em humanos, particularmente em áreas com más condições sanitárias e higiênicas.
- Transmissão: a infecção acontece quando os ovos do parasita são ingeridos, sendo encontrados no solo, na água ou em alimentos contaminados por fezes humanas;
- Diagnóstico: o diagnóstico laboratorial é conduzido pela detecção de ovos durante a análise parasitológica das fezes;
- Tratamento: envolve o uso de medicamentos como albendazol, mebendazol, levamisol, entre outros.
Doenças diarreicas agudas
As doenças diarreicas agudas (DDA) são condições médicas quase sempre autolimitadas, caracterizadas pela ocorrência de diarreia, que pode ser definida como um aumento na frequência e na quantidade de fezes. Na maioria das vezes, as DDAs estão associadas a fezes líquidas ou pastosas, dores abdominais, vômito e febre.
- Transmissão: a condição é provocada por diversos agentes, incluindo bactérias, vírus e parasitas, tais como rotavírus, adenovírus, Staphylococcus aureus, Entamoeba histolytica, Giardia lamblia, entre outros;
- Diagnóstico: são realizados exames parasitológicos das fezes, culturas de vírus e bactérias ou técnicas de imunocromatografia;
- Tratamento: o protocolo terapêutico não está vinculado ao diagnóstico da causa subjacente, consistindo apenas no manejo dos sintomas, que inclui a recomendação de hidratação por meio de sais de reidratação oral, visando prevenir a desidratação.
Enterobíase: Enterobius vermicularis
A enterobíase, também conhecida como oxiuríase, é uma infecção intestinal causada pelo parasita Enterobius vermicularis, um verme nematoide comumente chamado de oxiúro.
Essa infecção é bastante comum, principalmente em crianças. Uma característica proeminente é a coceira no ânus, que ocorre com frequência durante a noite e pode levar à irritação, desconforto e dificuldade para dormir. As lesões causadas pelo ato de coçar podem resultar em infecções secundárias ao redor do ânus, como inflamação e pequenas áreas de sangramento.
- Transmissão: as formas de transmissão variam. Por exemplo, a autocontaminação externa ou direta ocorre quando os ovos presentes na área anal são transferidos para a boca por meio das mãos — muito comum em crianças, pessoas com deficiência mental e adultos com hábitos de higiene precários. A transmissão indireta ocorre quando os ovos, presentes na poeira ou nos alimentos, infectam a mesma pessoa que os eliminou. Na heteroinfecção, os ovos presentes na poeira ou nos alimentos contaminam outra pessoa. Na retroinfestação, as larvas migram da área anal para regiões mais altas do intestino grosso, como o ceco, onde amadurecem em vermes adultos. Por fim, na autocontaminação interna, um processo raro, as larvas eclodem no reto e depois migram para o ceco, onde se desenvolvem em vermes adultos;
- Diagnóstico: o diagnóstico laboratorial é realizado identificando o parasita e seus ovos. Como raramente são detectados nos exames de fezes de rotina, encontrados acidentalmente em casos de infecção intensa, a pesquisa direta na região perianal é recomendada;
- Tratamento: usualmente, envolve o uso de medicamentos como pamoato de pirvínio, mebendazol e albendazol.
Esquistossomose: Schistosoma mansoni
A esquistossomose, causada pelo parasita Schistosoma mansoni, é uma doença parasitária crônica que afeta milhões de pessoas em regiões tropicais e subtropicais. As complicações são fibrose hepática, hipertensão portal, insuficiência hepática severa e hemorragia digestiva. Pode ocorrer comprometimento do sistema nervoso central e de outros órgãos. Nos rins, pode ocorrer glomerulonefrite.
- Transmissão: ovos do Schistosoma mansoni são expelidos nas fezes do hospedeiro infectado. Na água, os ovos eclodem e liberam uma larva ciliada chamada miracídio, que infecta o caramujo. Após um período de quatro a seis semanas, as larvas deixam o caramujo, agora na forma de cercária, e ficam livres na água. O contato humano com águas contaminadas pelas cercárias é a principal forma de contrair a esquistossomose;
- Diagnóstico: pode ser realizado através da análise parasitológica das fezes, utilizando a técnica de concentração para identificar os ovos, e também pela técnica do Kato-Katz, utilizada para avaliar a carga parasitária;
- Tratamento: envolve a administração dos medicamentos praziquantel ou oxamniquina.
Estrongiloidíase: Strongiloides stercoralis
A estrongiloidíase é uma infecção parasitária causada pelo nematoide Strongyloides stercoralis. Esse parasita vive no solo em regiões tropicais e subtropicais e infecta os seres humanos penetrando na pele.
- Transmissão: as larvas infestantes, chamadas de filarioides, penetram no corpo humano atravessando a pele e viajando até os pulmões, traqueia e epiglote, alcançando eventualmente o trato digestivo. Lá, elas se desenvolvem em vermes adultos;
- Diagnóstico: realizado por meio da análise parasitológica das fezes;
- Tratamento: é feito por meio dos medicamentos cambendazol, tiabendazol, albendazol e ivermectina.
Giardíase: Giardia lamblia
A giardíase é uma infecção intestinal causada pelo protozoário Giardia lamblia. Esse parasita é comumente encontrado em ambientes aquáticos contaminados, como lagos, rios e fontes de água não tratada. A infecção sintomática pode apresentar-se por meio de diarreia, acompanhada de dor abdominal.
- Transmissão: ocorre via fecal-oral, podendo ser direta, através da contaminação das mãos e subsequente ingestão de cistos presentes em fezes de uma pessoa infectada; ou indireta, pela ingestão de água ou alimentos contaminados;
- Diagnóstico: realizado pela detecção de cistos ou trofozoítos durante o exame direto das fezes; ou por técnicas de concentração e coloração permanente;
- Tratamento: medicamentoso com a utilização de secnidazol, tinidazol e metronidazol, a depender da orientação médica.
Teníase / cisticercose
A teníase é causada pela presença da forma adulta da Taenia solium, conhecida como “tênia do porco”, e da Taenia saginata, a “tênia do boi”. Ambos os parasitos provocam doença intestinal, denominada teníase, enquanto os ovos da T. solium podem levar a infecções somáticas, resultando em cisticercose.
A teníase pode provocar dores abdominais, náuseas, fraqueza, perda de peso, gases, diarreia ou constipação. Já as manifestações clínicas da cisticercose variam conforme a localização, tipo morfológico, número de larvas infectantes, fase de desenvolvimento dos cisticercos e resposta imunológica do hospedeiro. Formas graves são encontradas rotineiramente no sistema nervoso central, apresentando sintomas oftálmicos e neuropsiquiátricos, como convulsões, distúrbios de comportamento e hipertensão intracraniana.
- Transmissão: ocorre pela ingestão de carne bovina ou suína mal cozida, que contém as larvas do parasita;
- Diagnóstico: costuma envolver uma análise microscópica. Pode ser realizado o exame parasitológico das fezes para detectar os ovos, com diferenciação morfológica dos ovos da tênia em relação a outros parasitas. A distinção entre as espécies é feita pela análise microscópica;
- Tratamento: para o tratamento da teníase, podem ser utilizados medicamentos como mebendazol, niclosamida ou clorossalicilamida, além do praziquantel. No caso da neurocisticercose, o tratamento consiste no uso de praziquantel em conjunto com dexametasona, a fim de reduzir a resposta inflamatória causada pela morte dos cisticercos. Também pode ser administrado albendazol em combinação com metilprednisolona. Às vezes, é necessário o uso de anticonvulsivantes, uma vez que alguns dos pacientes apresentam epilepsia associada.
Como realizar a prevenção de parasitoses?
A prevenção e controle de infecções parasitárias passa por medidas de higiene e controle medicamentoso em períodos pré-definidos. A OMS propõe intervenções que englobam a administração periódica de medicamentos como albendazol ou mebendazol em grupos específicos em áreas de risco. Recomenda-se o tratamento comunitário anual em áreas com prevalência de infecção entre 20% e 50%, e semestral em áreas com mais de 50% de prevalência. Esses tratamentos devem utilizar doses eficazes e seguras, garantindo que crianças e gestantes recebam o cuidado adequado em regiões específicas.
Para controlar a disseminação de protozoários, são essenciais práticas de higiene, como lavagem adequada das mãos, manejo seguro de alimentos e atenção especial em ambientes como creches, onde a transmissão pode ser mais fácil. Medidas adicionais, como precauções de contato e desinfecção com produtos apropriados, são indicadas durante surtos institucionais. Adotando essas ações, é possível reduzir a incidência de parasitoses intestinais, protegendo a saúde individual e coletiva.
Vale ressaltar que a prevenção é melhor do que o tratamento. Por isso, é crucial ter maior investimento em educação, saúde e melhorias nas condições de vida e infraestrutura sanitária da população.
Agora que você conheceu as principais parasitoses intestinais, sugerimos a leitura do conteúdo sobre a importância do microbioma intestinal, para que você possa compreender melhor como cuidar da saúde do seu intestino.
Sabin avisa:
Este conteúdo é meramente informativo e não pretende substituir consultas médicas, avaliações por profissionais de saúde ou fornecer qualquer tipo de diagnóstico ou recomendação de exames.
Importante ressaltar que diagnósticos e tratamentos devem ser sempre indicados por uma avaliação médica individual. Em caso de dúvidas, converse com seu médico. Somente o profissional pode esclarecer todas as suas perguntas.
Lembre-se: qualquer decisão relacionada à sua saúde sem orientação profissional pode ser prejudicial.
Referências:
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CENTRO NACIONAL DE EPIDEMIOLOGIA. Doenças infecciosas e parasitárias: guia de bolso. Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, Centro Nacional de Epidemiologia, 2010. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/doencas_infecciosas_parasitaria_guia_bolso.pdf. Acesso em 11/04/2024.
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