Os rins, por estarem envolvidos em múltiplas funções, são órgãos fundamentais para o bom funcionamento do organismo. Na insuficiência renal crônica, os rins perdem gradualmente a capacidade de efetuar essas funções, prejudicando a saúde como um todo.
Segundo estudos, a condição pode afetar entre 8% e 16% da população mundial. No Brasil, estima-se que mais de dez milhões de pessoas sofram de insuficiência renal, destacando sua relevância para a saúde pública.
A insuficiência renal crônica possui evolução lenta e ausência de sintomas em estágios iniciais. Portanto, é imprescindível detectá-la precocemente, por meio de exames e consultas periódicas para impedir seu avanço.
Neste conteúdo, traremos informações muito importantes sobre as principais causas, estágios, sintomas, diagnóstico e tratamento.
O que é a insuficiência renal crônica?
A insuficiência renal (também conhecida como doença renal) é a perda funcional dos rins e pode ser classificada como aguda ou crônica. A aguda é caracterizada por falha súbita e rápida da função renal, podendo ser desencadeada por uma lesão nos rins ou sepse (infecção generalizada). No quadro crônico, a insuficiência renal ocorre de forma lenta, progressiva e irreversível, em decorrência de um conjunto de fatores ou doenças.
Os rins possuem múltiplas funções no organismo, atuando no controle da pressão arterial, eliminação de toxinas presentes no sangue, controle da água e sais minerais, equilíbrio do pH sanguíneo, produção de hormônios, entre outros. Devido ao grau de importância funcional dos rins, o paciente com insuficiência renal crônica pode ter sua saúde gravemente prejudicada, apresentando danos em cada uma dessas funções.
Em estágios avançados, os rins deixam de funcionar por completo, sendo necessária a realização de diálise ou transplante renal para a manutenção da vida.
Quais as causas da insuficiência renal crônica?
Diversos fatores podem influenciar o desenvolvimento da insuficiência renal crônica. Geralmente, o quadro surge quando o rim sofre agressões contínuas e prolongadas, como no diabetes ou na hipertensão arterial.
Imagine uma pessoa que sofre de diabetes do tipo 2 e não realiza o controle glicêmico (açúcar no sangue) corretamente. Nesse caso, há um importante dano aos vasos sanguíneos, alterando estruturas importantes para o funcionamento dos rins, que vai perdendo sua capacidade de filtrar o sangue.
Na hipertensão, a pressão arterial elevada também prejudica os vasos renais, reduzindo o fluxo sanguíneo e, consequentemente, prejudicando sua função. Se não houver o tratamento adequado, a hipertensão arterial pode danificar os vasos, levando gradualmente à insuficiência renal.
Outras causas para a condição incluem glomerulonefrites, gota, cálculos renais e infecções urinárias recorrentes, doenças autoimunes (como o lúpus), uso abusivo de medicamentos que possuem grau de toxicidade para os rins, entre outras.
Estágios da insuficiência renal crônica
Como mencionado, a evolução da insuficiência renal crônica é lenta e pode ser dividida em diferentes estágios. A divisão baseia-se na capacidade de filtração do rim — em média, 180 litros de sangue por dia, ou 90 a 125 mililitros por minuto. Esses valores são conhecidos como taxa de filtração glomerular (TFG) e podem ser estimados a partir do exame de dosagem da creatinina sérica.
A dosagem de creatinina no sangue é um exame bastante utilizado para a avaliação da função renal. A creatinina é uma substância produzida em decorrência do metabolismo muscular e que se acumula na corrente sanguínea. Sua eliminação ocorre pelos rins, que filtram o sangue para que ela saia na urina.
A partir dos níveis de creatinina no sangue, é possível, por meio de cálculos, estimar a TFG. A seguir, apresentaremos os diferentes estágios da insuficiência renal crônica.
Estágio 1
O primeiro estágio é definido quando pacientes com alguma doença que representa fator de risco à insuficiência renal crônica — como a hipertensão e o diabetes — apresentam TFG maior que 90 mililitros por minuto (normal).
Nesses pacientes, é bastante comum a presença de lesão renal, ainda que sutil, mas que não manifesta sintomas e não prejudica a função dos rins. É importante esclarecer que o estágio 1 não é enquadrado como insuficiência renal, mas sim um quadro clínico que demanda alerta pelo alto risco, a longo prazo, de doença renal.
Estágio 2
Classificado como uma pré-insuficiência renal, o estágio 2 é caracterizado por pacientes que apresentam TFG entre 60 e 90 mililitros por minuto. Apesar de apresentarem pequenas perdas funcionais, os rins ainda conseguem desempenhar suas funções normalmente.
Esse estágio é um sinal de alerta quando o paciente tem uma doença que se enquadra como fator de risco renal, mas é também observado no processo de envelhecimento. Com o passar dos anos, os rins têm sua função reduzida, entretanto, não acarreta maiores problemas em médio/longo prazo às pessoas idosas.
Estágio 3
O estágio 3 é caracterizado por uma TFG reduzida, entre 30 e 59 mililitros por minuto, o que significa que os rins estão funcionando com uma capacidade de filtração baixa. Nesses pacientes, os níveis de creatinina estão elevados e as primeiras complicações da doença renal começam a se desenvolver. É nesse estágio que se define o quadro como insuficiência renal crônica.
A progressão da insuficiência renal a partir dessa fase costuma ser rápida se não houver intervenção. Portanto, é essencial ter acompanhamento de um médico nefrologista e realizar o tratamento adequado para retardar a progressão da doença e prevenir complicações graves.
Estágio 4
Nessa fase, ocorre uma diminuição significativa da função renal, com a TFG apresentando valores de 15 a 29 mililitros por minuto. No estágio 4, também conhecido como pré-diálise, começam a surgir sintomas mais alarmantes e diversas alterações nos exames laboratoriais.
Algumas das complicações que podem ocorrer no estágio 4 incluem anemia, desequilíbrios eletrolíticos, hipertensão arterial e doenças ósseas e metabólicas.
A partir desse estágio, começa-se a considerar a realização de diálise, procedimento feito através de uma máquina que filtra e limpa o sangue, realizando parte do trabalho que o rim não consegue mais fazer.
Estágio 5
É a última e mais grave fase da insuficiência renal crônica, caracterizada pela TFG entre 10 e 15 mililitros por minuto, e chamada “doença renal terminal”. Nessa faixa, o rim já não desempenha mais suas funções básicas, sendo necessário apoio da diálise. Se a diálise não for iniciada, o quadro progride, podendo levar o paciente a óbito.
Quais os sintomas mais comuns?
Os rins são responsáveis pela síntese de um hormônio chamado eritropoetina, o qual estimula a produção de hemácias. Na doença renal, a produção de eritropoetina é prejudicada e, com a evolução da insuficiência renal crônica, é frequente o surgimento de anemia.
Diversos outros parâmetros sanguíneos e hormonais podem estar alterados, ocorrendo desregulação do pH do sangue, do equilíbrio hidroeletrolítico, metabolismo ósseo e agravamento da hipertensão arterial. As concentrações de potássio no sangue também se elevam em estágios avançados, podendo ocasionar arritmias.
Outros sintomas incluem fadiga, perda de apetite, emagrecimento, mau hálito e edema de membros inferiores ou de forma generalizada. É importante destacar novamente que a insuficiência renal crônica é silenciosa nos estágios iniciais, e, na maioria dos casos, os pacientes podem apresentar sintomas somente quando a doença já está muito avançada.
Urinar pouco ou sentir dor pode ser indício de insuficiência renal?
Não, apesar de muitas pessoas acreditarem que o volume da urina pode ser um bom indicador para a saúde renal. Na verdade, só há alteração no volume urinário em estágios mais avançados. Isso acontece porque, nos estágios iniciais da doença renal crônica, o rim consegue se adaptar relativamente bem à perda de função, mantendo estável o volume de urina produzido diariamente.
Sentir dor também não é um bom parâmetro que indique insuficiência renal crônica. Como o rim não apresenta uma grande quantidade de inervação para a dor, ela só ocorre em casos de inflamação ou presença de cálculos renais, por exemplo, o que não é comum na doença crônica.
Como o diagnóstico é realizado?
O diagnóstico da insuficiência renal crônica normalmente é confirmado por meio de exames laboratoriais. Conforme já explicamos, a creatinina é um parâmetro muito utilizado para a avaliação da função renal e definição da TFG.
No entanto, a creatinina pode estar elevada em outros contextos, como na doença renal aguda. Dessa forma, não representa um parâmetro suficiente para diagnóstico da doença crônica, quando analisado isoladamente.
Uma alternativa disponível para avaliar a TFG é a dosagem de cistatina C, proteína produzida constantemente pelas células do corpo, que possui nível sérico quase totalmente dependente da filtração dos rins. A determinação de cistatina C é mais sensível do que a dosagem isolada da creatinina, sendo um marcador mais confiável para a mensuração da TFG.
É rotina também a realização de exames correlatos, como o hemograma para a detecção de anemia, dosagens de eletrólitos (cálcio, fósforo e potássio), mensuração do pH sanguíneo e dos níveis de hormônios da paratireoide (PTH).
O PTH é um hormônio fundamental para a manutenção da saúde óssea, estando seus níveis elevados na insuficiência renal crônica. Como resultado, podem surgir consequências ósseas graves em decorrência desse desbalanço.
Exames complementares podem ser solicitados, como exames de urina, imagem (ultrassonografia) e biópsia, para avaliação de lesão no tecido renal.
Existe tratamento para insuficiência renal crônica?
Por se tratar de lesões irreversíveis nos rins, não existe um tratamento que restaure a função renal. Em geral, a terapia para insuficiência renal crônica destina-se a frear o avanço da condição ou desacelerar a taxa de perda de função renal.
Controlar as doenças que aceleram o quadro é indispensável, principalmente a hipertensão arterial e o diabetes. Outro ponto crucial é que pacientes com insuficiência renal crônica devem evitar a utilização de medicamentos tóxicos aos rins (anti-inflamatórios, por exemplo).
O tratamento inclui também o manejo dos problemas de saúde que surgem em decorrência da condição, como os distúrbios nos eletrólitos, controle da anemia, cuidados com a saúde óssea, diminuição dos edemas, entre outros.
Caso o paciente atinja os níveis mais críticos da doença, quando os rins deixam de funcionar, é necessária a realização de hemodiálise, diálise peritoneal ou transplante renal — processo no qual um rim saudável de uma pessoa viva ou falecida é doado, de acordo com os critérios de compatibilidade.
Mais do que tratar, é muito importante ter a consciência de que a insuficiência renal crônica pode ser prevenida. Por isso, realize sempre exames e consultas médicas de rotina, especialmente se você for portador de doenças de alto risco para lesão renal.
Manter a glicemia e a pressão arterial controladas são importantes fatores que ajudam a reduzir a chance ou o agravamento da condição. Estabeleça também uma rotina de vida saudável, incluindo a prática de exercícios físicos regulares, uma alimentação equilibrada e uma excelente hidratação.
Gostaria de saber mais detalhes sobre uma das doenças que podem influenciar o desenvolvimento da insuficiência renal crônica? Então, leia o artigo sobre diabetes e cuide da sua saúde.
Referências:
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