Sabin Por: Sabin
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O teste FAN-HEp-2 é amplamente utilizado para detectar anticorpos anticélula, ajudando na investigação de diferentes doenças autoimunes. A interpretação correta do teste e a inclusão de todos os domínios celulares garantem a eficácia do exame, evitando diagnósticos errôneos e investigações desnecessárias.

Confira o conteúdo detalhado para aprofundar seu conhecimento sobre o diagnóstico de doenças autoimunes, com o teste FAN-HEp-2.

O que são anticorpos anticélula (FAN)?

Os anticorpos anticélula, amplamente conhecidos como Fator Antinuclear (FAN), são anticorpos direcionados contra antígenos presentes no interior das células. Eles desempenham um papel importante na identificação e no diagnóstico de doenças autoimunes. 

O substrato mais frequentemente utilizado para a pesquisa dos anticorpos é composto por células HEp-2. Esse tipo de célula oferece uma visualização detalhada de diversos componentes celulares, permitindo uma análise precisa e abrangente dos anticorpos presentes.

O teste para a detecção de anticorpos anticélula, chamado de Fator Antinúcleo, ficou conhecido como FAN desde a década de 40, quando os primeiros anticorpos descritos eram direcionados contra componentes do núcleo celular. À medida que as pesquisas avançaram, foram identificados anticorpos dirigidos não apenas contra o núcleo, mas também contra o citoplasma, o nucléolo, o aparelho mitótico e a membrana nuclear.

Assim, devido à variedade de alvos intracelulares reconhecidos por esses autoanticorpos, tornou-se necessário adequar a terminologia utilizada para o exame. O Consenso Brasileiro de Autoanticorpos, ciente disso, propôs que seja adotado o termo “anticorpos anticélula”, mantendo a sigla FAN na descrição do exame, por razões de tradição e reconhecimento por parte do clínico. Tal atualização terminológica contempla a diversidade de componentes celulares que podem ser alvo dos autoanticorpos.

O teste FAN deve ser especificado como FAN HEp-2 para indicar que as células HEp-2 foram usadas como substrato. Essa especificação é crucial, pois assegura a padronização e a comparabilidade dos resultados, tornando-se uma ferramenta diagnóstica necessária para a detecção de várias doenças autoimunes. Entre elas, podemos destacar: doenças reumáticas sistêmicas imunomediadas, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES); esclerose sistêmica; dermatopolimiosite; síndrome de Sjögren; entre outras.

Coleta de amostras e padrões de FAN

A coleta da amostra é utilizada para identificar a presença de autoanticorpos através da observação de padrões específicos de fluorescência. Existem diferentes padrões de FAN, cada um voltado contra estruturas celulares específicas. Determinados padrões estão classicamente associados a alguns tipos de doenças autoimunes. Esses padrões são relevantes para a diferenciação entre as diversas condições autoimunes, possibilitando um diagnóstico mais preciso e, em algumas situações, um manejo clínico mais direcionado.

Os padrões Nuclear Pontilhado Fino e Nuclear Pontilhado Fino Denso figuram entre os padrões de FAN-HEp-2 mais comumente observados na rotina laboratorial de pesquisa de autoanticorpos dirigidos contra antígenos celulares. Em especial, o padrão Nuclear Pontilhado Fino responde pela maioria dos resultados positivos de FAN liberados diariamente. Entretanto, em muitas casuísticas apresentadas na literatura internacional, o padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso é apontado como o mais usualmente descrito.

Aplicação clínica da pesquisa de FAN

Inicialmente, o teste FAN (Fator Antinúcleo) era principalmente empregado na investigação de lúpus eritematoso sistêmico (LES). No entanto, com o reconhecimento de sua importância, o exame passou a ser utilizado na investigação de outras doenças reumáticas imunomediadas e também no suporte à investigação de doenças de outras especialidades médicas. 

A capacidade de detectar uma grande variedade de autoanticorpos tornou o teste um recurso importante na prática clínica, como exame de primeira linha na investigação de doenças autoimunes.

Apesar de sua ampla utilização, a popularização do teste FAN trouxe consigo alguns desafios significativos. Em muitos casos, o teste é solicitado mesmo quando o quadro clínico do paciente é pouco específico e não necessariamente indicativo de uma doença autoimune. Isso resultou em uma redução no desempenho diagnóstico do exame. Como consequência, a chance de um resultado positivo do FAN representar uma real condição autoimune foi bastante comprometida, devendo ser interpretado com cautela, à luz do quadro clínico do paciente. 

Em um contexto clínico, no qual a probabilidade de doença autoimune é baixa, a interpretação indevida do resultado positivo do teste pode trazer diversos problemas, tanto para os profissionais de saúde quanto para os pacientes. A condução equivocada do processo diagnóstico pode, ainda, resultar em interpretações inadequadas e encaminhamentos e investigações adicionais desnecessárias. 

Esses fatores acarretam custos adicionais, aumentam a carga sobre o sistema de saúde e, além disso, causam desconforto e preocupação injustificada aos pacientes.

Como o exame é realizado?

O teste FAN-HEp-2 é realizado a partir de amostras de sangue do paciente, utilizando a técnica de imunofluorescência indireta em células HEp-2 (IFI/HEp-2). A leitura e a interpretação do teste FAN-HEp-2 devem seguir as recomendações do Consenso Brasileiro de Autoanticorpos, que atualmente está na sua sexta edição. Essas diretrizes garantem a padronização e a precisão dos resultados, assegurando que todos os aspectos relevantes do exame sejam considerados.

Para a correta interpretação do teste, é importante que todos os domínios celulares sejam incluídos na leitura e descrição do exame, para facilitar a interpretação clínica dos resultados. Os domínios consistem em núcleo, nucléolo, citoplasma, placa metafísica, aparelho mitótico e membrana nuclear.

Marcadores

Alguns padrões de fluorescência do FAN-HEp-2 têm seu alvo antigênico devidamente identificado e disponível comercialmente para ser dosado, caso seja necessário.

A título de exemplo, o padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso, citado anteriormente como um dos padrões mais prevalentes na rotina laboratorial de FAN, é decorrente da presença de anticorpos dirigidos contra os antígenos LEDGF75 ou DFS70. A identificação de determinados anticorpos auxilia na confirmação do padrão observado na fluorescência.

Em algumas situações clínicas, nas quais o padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso é descrito, é recomendada a pesquisa dos anticorpos específicos anti-LEDGF75 ou anti-DFS70, para uma melhor interpretação do FAN.

Nesses casos, a pesquisa de anticorpos anti-LEDGF75 é realizada utilizando a técnica de ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay). Sensível e específica, essa técnica permite a detecção precisa dos anticorpos no soro do paciente. A confirmação da presença desses anticorpos valida a interpretação do padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso no teste FAN-HEp-2.

A identificação correta do padrão de FAN e, em muitas situações, a confirmação da presença de anticorpos específicos, relacionados ao padrão de FAN descrito, são fundamentais para o diagnóstico de doenças autoimunes e para a distinção de condições autoimunes de outras patologias.

Um relatório detalhado e abrangente oportuniza ao clínico correlacionar os achados laboratoriais com o quadro clínico do paciente, orientando de forma precisa o diagnóstico e o manejo terapêutico.

Para continuar se aprofundando em temas relacionados, sugerimos a leitura do conteúdo sobre quando pensar e como investigar doenças reumáticas autoimunes. Boa leitura! 

Referências:

Cruvinel, W. de M., Andrade, L. E. C., von Mühlen, C. A., Dellavance, A., Ximenes, A. C., Bichara, C. D., Bueno, C., Mangueira, C. L. P., Bonfá, E., Brito, F. de A., Flumian, F. B., Silva, G. G. da ., Rêgo, J., Anjos, L. M. E. dos ., Slhessarenko, N., Pasoto, S. G., Neves, S. P. F., Valim, V., Santos, W. S. dos ., & Francescantonio, P. L. C.. (2019). V Brazilian consensus guidelines for detection of anti-cell autoantibodies on hep-2 cells. Advances in Rheumatology, 59, 28. doi: 10.1186/s42358-019-0069-5

Cruvinel, W. de M., Andrade, L. E. C., Dellavance, A., Ximenes, A. C., Bichara, C. D. A., Mangueira, C. L. P., Bonfá, E., Brito, F. de A., Mariz, H. A., Anjos, L. M. E. dos ., Pasoto, S. G., Valim, V., Santos, W. F. S. dos ., Gomes, C. M., Neves, R. A., & Francescantonio, P. L. C.. (2022). VI Brazilian consensus guidelines for detection of anti-cell autoantibodies on HEp-2 cells. Advances in Rheumatology, 62, 34. doi: 10.1186/s42358-022-00266-z

Cruvinel WDM, Andrade LEC, Von Mühlen CA, et al. V Brazilian consensus guidelines for detection of anti-cell autoantibodies on hep-2 cells. Adv Rheumatol. 2019;59(1):28. doi: 10.1186/s42358-019-0069-5

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Detecção de anticorpos anticélula (FAN) em doenças autoimunes; O teste FAN-HEp-2 é amplamente utilizado para detectar anticorpos anticélula, ajudando na investigação de diferentes doenças autoimunes. A interpretação correta do teste e a inclusão de todos os domínios celulares garantem a eficácia do exame, evitando diagnósticos errôneos e investigações desnecessárias. Confira o conteúdo detalhado para aprofundar seu conhecimento sobre o diagnóstico de doenças autoimunes, com o teste FAN-HEp-2. O que são anticorpos anticélula (FAN)? Os anticorpos anticélula, amplamente conhecidos como Fator Antinuclear (FAN), são anticorpos direcionados contra antígenos presentes no interior das células. Eles desempenham um papel importante na identificação e no diagnóstico de doenças autoimunes.  O substrato mais frequentemente utilizado para a pesquisa dos anticorpos é composto por células HEp-2. Esse tipo de célula oferece uma visualização detalhada de diversos componentes celulares, permitindo uma análise precisa e abrangente dos anticorpos presentes. O teste para a detecção de anticorpos anticélula, chamado de Fator Antinúcleo, ficou conhecido como FAN desde a década de 40, quando os primeiros anticorpos descritos eram direcionados contra componentes do núcleo celular. À medida que as pesquisas avançaram, foram identificados anticorpos dirigidos não apenas contra o núcleo, mas também contra o citoplasma, o nucléolo, o aparelho mitótico e a membrana nuclear. Assim, devido à variedade de alvos intracelulares reconhecidos por esses autoanticorpos, tornou-se necessário adequar a terminologia utilizada para o exame. O Consenso Brasileiro de Autoanticorpos, ciente disso, propôs que seja adotado o termo "anticorpos anticélula", mantendo a sigla FAN na descrição do exame, por razões de tradição e reconhecimento por parte do clínico. Tal atualização terminológica contempla a diversidade de componentes celulares que podem ser alvo dos autoanticorpos. O teste FAN deve ser especificado como FAN HEp-2 para indicar que as células HEp-2 foram usadas como substrato. Essa especificação é crucial, pois assegura a padronização e a comparabilidade dos resultados, tornando-se uma ferramenta diagnóstica necessária para a detecção de várias doenças autoimunes. Entre elas, podemos destacar: doenças reumáticas sistêmicas imunomediadas, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES); esclerose sistêmica; dermatopolimiosite; síndrome de Sjögren; entre outras. Coleta de amostras e padrões de FAN A coleta da amostra é utilizada para identificar a presença de autoanticorpos através da observação de padrões específicos de fluorescência. Existem diferentes padrões de FAN, cada um voltado contra estruturas celulares específicas. Determinados padrões estão classicamente associados a alguns tipos de doenças autoimunes. Esses padrões são relevantes para a diferenciação entre as diversas condições autoimunes, possibilitando um diagnóstico mais preciso e, em algumas situações, um manejo clínico mais direcionado. Os padrões Nuclear Pontilhado Fino e Nuclear Pontilhado Fino Denso figuram entre os padrões de FAN-HEp-2 mais comumente observados na rotina laboratorial de pesquisa de autoanticorpos dirigidos contra antígenos celulares. Em especial, o padrão Nuclear Pontilhado Fino responde pela maioria dos resultados positivos de FAN liberados diariamente. Entretanto, em muitas casuísticas apresentadas na literatura internacional, o padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso é apontado como o mais usualmente descrito. Aplicação clínica da pesquisa de FAN Inicialmente, o teste FAN (Fator Antinúcleo) era principalmente empregado na investigação de lúpus eritematoso sistêmico (LES). No entanto, com o reconhecimento de sua importância, o exame passou a ser utilizado na investigação de outras doenças reumáticas imunomediadas e também no suporte à investigação de doenças de outras especialidades médicas.  A capacidade de detectar uma grande variedade de autoanticorpos tornou o teste um recurso importante na prática clínica, como exame de primeira linha na investigação de doenças autoimunes. Apesar de sua ampla utilização, a popularização do teste FAN trouxe consigo alguns desafios significativos. Em muitos casos, o teste é solicitado mesmo quando o quadro clínico do paciente é pouco específico e não necessariamente indicativo de uma doença autoimune. Isso resultou em uma redução no desempenho diagnóstico do exame. Como consequência, a chance de um resultado positivo do FAN representar uma real condição autoimune foi bastante comprometida, devendo ser interpretado com cautela, à luz do quadro clínico do paciente.  Em um contexto clínico, no qual a probabilidade de doença autoimune é baixa, a interpretação indevida do resultado positivo do teste pode trazer diversos problemas, tanto para os profissionais de saúde quanto para os pacientes. A condução equivocada do processo diagnóstico pode, ainda, resultar em interpretações inadequadas e encaminhamentos e investigações adicionais desnecessárias.  Esses fatores acarretam custos adicionais, aumentam a carga sobre o sistema de saúde e, além disso, causam desconforto e preocupação injustificada aos pacientes. Como o exame é realizado? O teste FAN-HEp-2 é realizado a partir de amostras de sangue do paciente, utilizando a técnica de imunofluorescência indireta em células HEp-2 (IFI/HEp-2). A leitura e a interpretação do teste FAN-HEp-2 devem seguir as recomendações do Consenso Brasileiro de Autoanticorpos, que atualmente está na sua sexta edição. Essas diretrizes garantem a padronização e a precisão dos resultados, assegurando que todos os aspectos relevantes do exame sejam considerados. Para a correta interpretação do teste, é importante que todos os domínios celulares sejam incluídos na leitura e descrição do exame, para facilitar a interpretação clínica dos resultados. Os domínios consistem em núcleo, nucléolo, citoplasma, placa metafísica, aparelho mitótico e membrana nuclear. Marcadores Alguns padrões de fluorescência do FAN-HEp-2 têm seu alvo antigênico devidamente identificado e disponível comercialmente para ser dosado, caso seja necessário. A título de exemplo, o padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso, citado anteriormente como um dos padrões mais prevalentes na rotina laboratorial de FAN, é decorrente da presença de anticorpos dirigidos contra os antígenos LEDGF75 ou DFS70. A identificação de determinados anticorpos auxilia na confirmação do padrão observado na fluorescência. Em algumas situações clínicas, nas quais o padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso é descrito, é recomendada a pesquisa dos anticorpos específicos anti-LEDGF75 ou anti-DFS70, para uma melhor interpretação do FAN. Nesses casos, a pesquisa de anticorpos anti-LEDGF75 é realizada utilizando a técnica de ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay). Sensível e específica, essa técnica permite a detecção precisa dos anticorpos no soro do paciente. A confirmação da presença desses anticorpos valida a interpretação do padrão Nuclear Pontilhado Fino Denso no teste FAN-HEp-2. A identificação correta do padrão de FAN e, em muitas situações, a confirmação da presença de anticorpos específicos, relacionados ao padrão de FAN descrito, são fundamentais para o diagnóstico de doenças autoimunes e para a distinção de condições autoimunes de outras patologias. Um relatório detalhado e abrangente oportuniza ao clínico correlacionar os achados laboratoriais com o quadro clínico do paciente, orientando de forma precisa o diagnóstico e o manejo terapêutico. Para continuar se aprofundando em temas relacionados, sugerimos a leitura do conteúdo sobre quando pensar e como investigar doenças reumáticas autoimunes. Boa leitura!  Referências: Cruvinel, W. de M., Andrade, L. E. C., von Mühlen, C. A., Dellavance, A., Ximenes, A. C., Bichara, C. D., Bueno, C., Mangueira, C. L. P., Bonfá, E., Brito, F. de A., Flumian, F. B., Silva, G. G. da ., Rêgo, J., Anjos, L. M. E. dos ., Slhessarenko, N., Pasoto, S. G., Neves, S. P. F., Valim, V., Santos, W. S. dos ., & Francescantonio, P. L. C.. (2019). V Brazilian consensus guidelines for detection of anti-cell autoantibodies on hep-2 cells. Advances in Rheumatology, 59, 28. doi: 10.1186/s42358-019-0069-5 Cruvinel, W. de M., Andrade, L. E. C., Dellavance, A., Ximenes, A. C., Bichara, C. D. A., Mangueira, C. L. P., Bonfá, E., Brito, F. de A., Mariz, H. A., Anjos, L. M. E. dos ., Pasoto, S. G., Valim, V., Santos, W. F. S. dos ., Gomes, C. M., Neves, R. A., & Francescantonio, P. L. C.. (2022). VI Brazilian consensus guidelines for detection of anti-cell autoantibodies on HEp-2 cells. Advances in Rheumatology, 62, 34. doi: 10.1186/s42358-022-00266-z Cruvinel WDM, Andrade LEC, Von Mühlen CA, et al. V Brazilian consensus guidelines for detection of anti-cell autoantibodies on hep-2 cells. Adv Rheumatol. 2019;59(1):28. doi: 10.1186/s42358-019-0069-5