Não há dúvidas sobre a importância da vacinação contra a poliomielite como forma de eliminar essa doença tão grave, também conhecida como paralisia infantil. De fato, a vacina da pólio foi a grande responsável pela eliminação da doença no Brasil desde 1994 (com o último caso registrado em 1989).
A poliomielite é uma infecção provocada pelo poliovírus, que se instaura no intestino, podendo infectar crianças e adultos através do contato direto com fezes e demais secreções, gerando o risco de paralisias musculares.
Mas, diante do cenário atual da cobertura vacinal, será que a doença está mesmo eliminada no Brasil? Quais são os maiores desafios encontrados e a importância da vacina nesse processo? Continue a leitura e esclareça suas dúvidas sobre a poliomielite e como evitá-la.
O que é a poliomielite?
Também conhecida como pólio, a poliomielite é uma doença altamente infecciosa causada pelo poliovírus, um vírus de RNA pertencente à família dos picornavírus, que se distinguem em três sorotipos (1, 2 e 3).
A transmissão ocorre principalmente pela via fecal-oral, e a infecção pode ser confinada ao trato gastrointestinal por anticorpos induzidos por vacinação, infecção prévia ou adquiridos por bebês durante a gestação (duram poucos meses no início da vida).
A maioria das infecções por poliovírus é assintomática, sendo que aproximadamente 25% dos casos resultam em uma doença menor com recuperação completa. No entanto, a depender do tipo de poliovírus, as infecções podem ser associadas à paralisia, afetando um ou mais membros. Em casos graves, pode levar a quadros de quadriplegia, insuficiência respiratória e, raramente, morte.
A paralisia residual ocorre em cerca de dois terços dos casos. Para muitos indivíduos com déficits residuais e até mesmo para alguns que se recuperam completamente, é possível haver um agravamento da fraqueza ou paralisia após 20 a 30 anos, o que é conhecido como síndrome pós-pólio.
A poliomielite está mesmo eliminada no Brasil?
No Brasil, o último caso de poliovírus selvagem surgiu em 1989, na Paraíba. Por isso, o país recebeu em 1994, pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o certificado de área livre de circulação do poliovírus selvagem. Desde então, vem se esforçando para alcançar a meta dos indicadores estabelecidos pelo Ministério da Saúde (MS) e se manter livre do contágio do vírus.
Uma doença eliminada ainda merece atenção?
Certamente! Afinal, a cobertura da vacina contra a poliomielite é não homogênea, o que pode provocar a formação de indivíduos não vacinados e aumentar o risco da reinserção do poliovírus.
O monitoramento das paralisias flácidas agudas continua sendo a estratégia principal para identificar um possível evento ou surto da doença. As finalidades disso são: manter o Brasil longe da circulação do poliovírus selvagem e fortalecer as práticas de erradicação.
Sobre essa questão, a OPAS afirma que, enquanto houver uma criança infectada, crianças de todos os países correm o risco de contrair a poliomielite. Se a doença não for erradicada, podem ocorrer até 200 mil novos casos no mundo, a cada ano, dentro do período de uma década.
Nesse contexto, em 2023, o Brasil foi classificado como de alto risco para a reintrodução do poliovírus, pela Comissão Regional para a Certificação da Erradicação da Poliomielite na Região das Américas, considerando o desempenho das coberturas vacinais, entre outros fatores. Segundo dados do MS, a cobertura vacinal no país foi de cerca de 85% em 2024.
Outro ponto que influencia na eliminação da doença é a existência do poliovírus selvagem em dois países: Afeganistão e Paquistão. Assim, uma simples viagem é capaz de importar o vírus e, sem a vacinação adequada, viabilizar sua reintrodução.
Por que a poliomielite é tão perigosa?
A ausência de saneamento básico, má higiene pessoal e condições habitacionais precárias, cenários frequentemente encontrados em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, são aspectos que favorecem a transmissão do poliovírus.
Além disso, as consequências da poliomielite estão ligadas à infecção do cérebro e da medula, ocasionando sequelas motoras sem cura, por exemplo:
- crescimento diferente das pernas, fazendo com que o indivíduo manque e fique mais inclinado para um lado, o que acaba provocando a escoliose;
- problemas e dores nas articulações;
- atrofia muscular;
- paralisia dos músculos da fala e da deglutição;
- paralisia de uma das pernas;
- pé torto, o que impede a pessoa de andar, pois seu calcanhar não encosta no chão.
Estimativas indicam que uma em cada 200 infecções leva a uma paralisia irreversível (geralmente das pernas) entre os acometidos, e 5% a 10% vão a óbito por paralisia dos músculos respiratórios.
Um dos maiores perigos da doença é o pensamento errado de que ela não existe mais e, por isso, não há a necessidade de vacinar as crianças. Essa má interpretação tem gerado uma redução significativa da cobertura vacinal, fazendo com que o índice fique abaixo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a manutenção da eliminação e do controle da doença.
Vacinas contra a poliomielite
Conheça, abaixo, os dois tipos de vacinas contra a poliomielite.
- Vacina Inativada Poliomielite (VIP): nomeada Salk em homenagem ao seu inventor, é um vacina trivalente e injetável;
- Vacina Oral Poliomielite (VOP): nomeada Sabin em homenagem ao seu inventor, é uma vacina oral atenuada bivalente, constituída pelos vírus da pólio tipos 1 e 3, vivos e enfraquecidos. No Brasil, é popularmente conhecida como “gotinha”.
Vacina VIP: Salk
A vacina injetável Salk é administrada por meio de injeção e é composta pelo vírus completamente inativado, o que impede o desenvolvimento da doença.
Nas clínicas da rede privada, o vírus inativado da poliomielite está inserido nas vacinas combinadas — pentavalente e hexavalente. Na rede pública, a VIP é aplicada no esquema básico de vacinação da criança, nos dois, quatro e seis meses de vida, com dose de reforço aos 15 meses, conforme recente atualização do Ministério da Saúde.
Vacina VOP: Sabin
A vacina poliomielite oral Sabin é administrada por via oral e é composta por vírus vivos atenuados. Uma criança que recebeu a vacina oral elimina o vírus pelas fezes e demais secreções, e isso pode fazer com que esse microrganismo circule no ambiente, sofra mutações e provoque mais doenças, sobretudo em países com proteção insuficiente contra a poliomielite.
Substituição da vacina oral pela injetável
No final de 2024, o Ministério da Saúde anunciou a substituição da tradicional vacina oral (gotinha) pela versão injetável em dose de reforço. A decisão foi baseada em critérios epidemiológicos, evidências científicas sobre a vacina e recomendações internacionais para deixar o esquema vacinal ainda mais seguro.
A mudança feita pelo órgão brasileiro está alinhada à recomendação dos órgãos de saúde internacionais. Mais de 60 países já não utilizam a vacina oral para evitar que o vírus vacinal possa circular no ambiente e sofrer mutações.
As campanhas de vacinação continuarão a ocorrer, exercendo o papel crucial de alertar a população para que mantenha seus calendários vacinais atualizados, impedindo que o vírus volte a circular. A mudança no calendário de vacinação busca, também, se adequar à orientação da OMS como parte do processo de erradicação mundial da pólio.
Qual a importância da vacinação?
Vacinar a população-alvo é uma ação imprescindível para minimizar o risco de reintrodução do poliovírus selvagem, garantindo um país livre da doença. Isso se deve ao fato de que a vacinação é o único meio de prevenção da doença.
Portanto, todas as crianças menores de cinco anos de idade precisam ser vacinadas conforme o esquema de vacinação e campanha nacional anual. Adicionalmente, viajantes procedentes ou com destino a áreas endêmicas devem ser igualmente vacinados.
É indispensável estar atento ao esquema vacinal e às campanhas nacionais, bem como esclarecer todos os mitos e verdades que possam gerar dúvidas quanto à eficácia de manter as crianças vacinadas. Para expandir seu conhecimento sobre a vacinação, indicamos a leitura do conteúdo sobre como deve acontecer a vacinação de prematuros.
Sabin avisa:
Este conteúdo é meramente informativo e não pretende substituir consultas médicas, avaliações por profissionais de saúde ou fornecer qualquer tipo de diagnóstico ou recomendação de exames.
Importante ressaltar que diagnósticos e tratamentos devem ser sempre indicados por uma avaliação médica individual. Em caso de dúvidas, converse com seu médico. Somente o profissional pode esclarecer todas as suas perguntas.
Lembre-se: qualquer decisão relacionada à sua saúde sem orientação profissional pode ser prejudicial.
Referências:
COFEN. Multivacinação não oferece risco e aumenta a imunidade coletiva. Disponível em: https://www.cofen.gov.br/multivacinacao-nao-oferece-risco-e-aumenta-imunidade-coletiva/ Acesso em: 11/12/2024
Ministério da Saúde. Vacina oral da poliomielite será substituída por dose ainda mais segura e eficiente. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/vacina-oral-da-poliomielite-sera-substituida-por-dose-ainda-mais-segura-e-eficiente Acesso em: 11/12/2024
Minor PD. An Introduction to Poliovirus: Pathogenesis, Vaccination, and the Endgame for Global Eradication. Methods Mol Biol. 2016;1387:1-10. doi: 10.1007/978-1-4939-3292-4_1
OPAS. Poliomielite. Disponível em: https://www.paho.org/pt/topicos/poliomielite Acesso em: 11/12/24