Doenças cardíacas são consideradas uma das principais causas de morte no mundo. A predisposição a essas doenças pode ser influenciada por diversos fatores, como alimentação, falta de atividade física, tabagismo, consumo de álcool e aspectos genéticos. Diante disso, os testes genéticos consistem em exames úteis para diagnóstico, identificação e estratificação de indivíduos com risco aumentado para determinadas doenças cardiovasculares hereditárias.
Ao analisar os genes associados a cada condição, por meio dos painéis genéticos, os médicos podem identificar variantes genéticas responsáveis por quadros clínicos, o que auxilia no diagnóstico e permite a implementação de medidas preventivas e estratégias de tratamento personalizadas.
Neste conteúdo, você encontrará informações importantes sobre a utilidade clínica desses exames e quais os painéis genéticos mais utilizados para a investigação de doenças cardíacas.
Quais as principais doenças cardíacas hereditárias?
As doenças cardíacas hereditárias podem ser desencadeadas pela presença de uma única variante patogênica (origem mendeliana) ou pelo resultado da soma de variações genéticas com efeitos pequenos para esse tipo de condição, mas que, em conjunto com outros fatores, podem ser significativas para o estabelecimento do quadro clínico.
Considerando a ampla variedade de causas e manifestações clínicas dessas doenças, é possível afirmar que as de origem mendeliana são passíveis de identificação através dos testes moleculares, ainda que sejam menos comuns do que condições multifatoriais, que podem ter etiologia poligênica.
A seguir, descrevemos brevemente algumas das principais doenças cardíacas hereditárias que possuem origem mendeliana.
Arritmias
As arritmias manifestam-se como irregularidades no ritmo cardíaco, resultando em disfunções no sistema cardiovascular. Entre as diversas condições mendelianas associadas às arritmias, estão as canalopatias, que englobam várias manifestações clínicas.
As arritmias podem resultar de variantes alélicas em genes associados à estrutura ou funcionamento dos canais responsáveis por regular a atividade elétrica do coração, como canais de cálcio, sódio e potássio.
Entre as principais canalopatias, destacam-se a síndrome de Brugada, a síndrome do QT longo, a síndrome do QT curto e a taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica:
Síndrome de Brugada
É uma condição genética caracterizada por alterações no eletrocardiograma (ECG) que aumentam o risco de arritmias ventriculares potencialmente graves. A doença é provocada por alterações genéticas em certos canais iônicos do coração.
Síndrome do QT longo
Essa síndrome afeta a repolarização cardíaca, levando a um prolongamento do intervalo QT no ECG, devido a anormalidades genéticas em canais de potássio ou sódio.
O intervalo QT é uma medida do tempo entre o início da contração de um ventrículo e o momento em que ele está pronto para contrair novamente. Um intervalo QT prolongado pode aumentar o risco de arritmias cardíacas graves, como a fibrilação ventricular, que pode levar a desmaios, convulsões e até morte súbita.
Síndrome do QT curto
Ao contrário da síndrome do QT longo, essa condição é caracterizada por um intervalo QT mais curto, o que também pode predispor arritmias ventriculares e, potencialmente, morte súbita.
É desencadeada por variantes genéticas raras que afetam o funcionamento de canais iônicos, encurtando a duração do potencial de ação dos miócitos ventriculares.
Taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica
É uma rara condição hereditária que leva a episódios de taquicardia ventricular polimórfica. Nesse caso, variantes genéticas afetam a regulação do cálcio intracelular no tecido cardíaco, levando os pacientes à predisposição de taquiarritmias ventriculares, especialmente durante o aumento da atividade adrenérgica (durante a prática de exercícios físicos, por exemplo).
Cardiomiopatias
Cardiomiopatias são um grupo de doenças cardíacas que afetam o músculo cardíaco, como a miocardiopatia hipertrófica e a miocardiopatia dilatada. Essas condições caracterizam-se por uma alteração na estrutura ou na função do miocárdio.
A miocardiopatia hipertrófica é uma doença congênita ou adquirida, decorrente da sobrecarga ventricular com disfunção diastólica. É uma condição que pode ser hereditária, com a participação de diversas variantes gênicas de padrão autossômico dominante já identificadas.
Já a miocardiopatia dilatada é uma condição definida pela disfunção miocárdica, que provoca insuficiência cardíaca, com predomínio de dilatação ventricular e disfunção sistólica. Segundo estudos, fatores genéticos desempenham um papel em até 30% dos casos, com mais de 60 variantes genéticas implicadas em sua etiologia.
Hipercolesterolemia familiar
A hipercolesterolemia familiar é uma condição genética hereditária que afeta o metabolismo do colesterol, levando a níveis excessivamente elevados de LDL no sangue.
Quando em excesso, o colesterol pode se acumular nas artérias e aumentar o risco de doenças cardiovasculares, incluindo ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais. A hipercolesterolemia familiar é causada por variantes genéticas específicas que estão envolvidas na regulação do metabolismo do colesterol.
Aortopatias
São um grupo de condições médicas que afetam a aorta, geralmente envolvendo alterações na estrutura ou na função do vaso e podem ser de origem genética ou adquiridas. As aortopatias podem estar associadas a síndromes genéticas, como a síndrome de Marfan e a síndrome de Ehlers-Danlos vascular, bem como formas mendelianas não sindrômicas.
A síndrome de Marfan afeta os tecidos conjuntivos, incluindo os que constituem vasos, como a aorta, em virtude de uma mutação no gene FBN1. Esse gene codifica a fibrilina, uma proteína importante para a integridade do tecido conjuntivo. Pacientes com essa síndrome têm uma maior probabilidade de desenvolver aneurismas na aorta.
A síndrome de Ehlers-Danlos vascular ocorre devido a variantes patogênicas no gene COL3A1, afetando o procolágeno tipo III. Indivíduos com essa síndrome podem apresentar fragilidade vascular, levando a complicações arteriais.
Anomalias cardíacas congênitas
As anomalias cardíacas congênitas são malformações do coração presentes desde o nascimento. Elas podem variar em gravidade, desde condições leves que podem não causar sintomas significativos até graves que requerem intervenção médica imediata. Muitas dessas anomalias estão associadas a síndromes genéticas, as quais podem ser investigadas precocemente por pediatras e especialistas em genética.
Qual a utilidade clínica de painéis genéticos em cardiologia?
Os testes genéticos são excelentes ferramentas para auxiliar na identificação de variantes genéticas associadas a doenças cardíacas hereditárias. Em conjunto com a avaliação clínica e outros parâmetros laboratoriais, esses exames contribuem muito para o diagnóstico precoce e a implementação de medidas de prevenção, monitoramento, estratificação de risco e tratamento personalizado.
Os painéis genéticos, em particular, possibilitam a investigação simultânea de numerosas condições capazes de apresentar manifestações clínicas similares, facilitando, assim, o diagnóstico diferencial.
É importante ressaltar que a detecção de variantes em um teste genético não é, por si só, um diagnóstico definitivo, e a correlação com achados clínicos é fundamental. Nem todas as variantes genéticas identificadas são patogênicas, e a interpretação dos resultados deve considerar a relevância clínica da alteração.
Os testes genéticos em cardiologia são úteis também para o aconselhamento genético, permitindo orientações precisas sobre o risco de recorrência da condição na família. Detectar uma variante patogênica em um paciente permite levar à identificação de outros membros da família em risco, que podem ainda estar assintomáticos, mas se beneficiar de monitoramento médico regular e intervenções precoces. O aconselhamento genético ajuda nessa avaliação, oferecendo informações importantes sobre a hereditariedade e orientações quanto às opções de manejo e prevenção.
Quais os painéis genéticos mais utilizados?
Os painéis genéticos para doenças cardíacas hereditárias de origem mendeliana utilizam a tecnologia de Sequenciamento de Nova Geração (NGS), uma abordagem que realiza a análise de múltiplos genes de forma simultânea, visando ao maior rendimento diagnóstico e à maior resolubilidade dos testes.
O NGS envolve a análise de DNA obtida a partir de uma amostra de sangue, saliva ou tecido do paciente. Pode ser feita a avaliação de gene único, quando existe a suspeita de condição causada por um único gene específico, sem outros diagnósticos diferenciais, ou mesmo investigação de variante familiar previamente identificada.
O Sabin dispõe de 20 painéis genéticos distintos para investigação de doenças cardíacas hereditárias, incluindo painéis menores e outros mais abrangentes (que podem incluir também a análise de DNA mitocondrial, quando pertinente). Painéis menores podem ser utilizados para uma investigação mais direcionada, apresentando menor chance de detecção de variantes de significado incerto, sendo mais utilizados quando o fenótipo da doença é específico. Já os painéis maiores e mais abrangentes podem ser utilizados para doenças com fenótipos inespecíficos, com muitos diagnósticos diferenciais. Esses exames permitem maior rendimento diagnóstico, no entanto, possuem maior chance de identificação de variantes de significado incerto.
Apesar da grande utilidade clínica, é fundamental reforçar que a decisão sobre qual painel genético solicitar vai depender da suspeita clínica e do histórico médico e familiar do paciente. Adicionalmente, o aconselhamento genético pré-teste é crucial para orientar os pacientes e familiares sobre os possíveis resultados e implicações genéticas.
Para se aprofundar ainda mais sobre o uso clínico de testes genéticos, sugerimos a leitura do conteúdo sobre a utilidade diagnóstica de exames genéticos no câncer hereditário.
Sabin avisa:
Este conteúdo é meramente informativo e não pretende substituir consultas médicas, avaliações por profissionais de saúde ou fornecer qualquer tipo de diagnóstico ou recomendação de exames.
Importante ressaltar que diagnósticos e tratamentos devem ser sempre indicados por uma avaliação médica individual. Em caso de dúvidas, converse com seu médico. Somente o profissional pode esclarecer todas as suas perguntas.
Lembre-se: qualquer decisão relacionada à sua saúde sem orientação profissional pode ser prejudicial.
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