A análise das subpopulações de linfócitos, por meio da citometria de fluxo, representa uma das mais importantes ferramentas da imunologia diagnóstica atual. A técnica permite caracterizar com precisão as células do sistema imunológico, que desempenham funções essenciais na imunidade celular e humoral. Em especial, linfócitos T (CD3⁺, CD4⁺, CD8⁺), linfócitos B (CD19⁺) e células natural killers (NK – CD16⁺/CD56⁺) são monitorados por sua relevância clínica em diversos contextos, como infecções recorrentes, doenças autoimunes e imunodeficiências primárias.
A citometria de fluxo revolucionou a imunofenotipagem celular, oferecendo alta especificidade e sensibilidade, tanto na diferenciação quanto na quantificação dessas células, além de permitir análises de maturação e ativação imunológica. Com o avanço tecnológico, tornou-se possível utilizar a metodologia para diagnóstico precoce e monitoramento terapêutico, sobretudo em pacientes imunocomprometidos.
Neste conteúdo, vamos explorar as principais indicações clínicas para esse exame, os testes oferecidos pelo Sabin, a interpretação de cada população celular e os fatores que influenciam os resultados laboratoriais.
Quando solicitar a quantificação de subpopulações de linfócitos?
A quantificação das subpopulações de linfócitos é indicada sempre que há suspeita de alterações qualitativas ou quantitativas no sistema imune. Entre os principais cenários clínicos, estão as imunodeficiências primárias, como imunodeficiência combinada grave (SCID), agamaglobulinemia ligada ao X e imunodeficiência comum variável (CVID). Esses distúrbios afetam diretamente a quantidade e/ou funcionalidade dos linfócitos, comprometendo a resposta imune.
Outro grupo que se destaca são os pacientes com infecções de repetição, especialmente oportunistas ou graves, que indicam possível disfunção imune. A avaliação também é fundamental no monitoramento de pacientes em uso de imunossupressores, como aqueles em tratamento com agentes biológicos para doenças autoimunes (lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide e esclerose múltipla), além de pacientes transplantados.
Nas doenças linfoproliferativas e hematológicas, como leucemias e linfomas, a quantificação de linfócitos também auxilia na diferenciação celular, no estadiamento e na avaliação de resposta ao tratamento. A citometria permite, ainda, o acompanhamento longitudinal do perfil imunológico em pacientes imunocomprometidos. Dessa forma, colabora tanto no plano terapêutico como no estabelecimento de um prognóstico.
Quais exames compõem a avaliação de subpopulações de linfócitos?
O portfólio do Sabin oferece uma gama de exames realizados por citometria de fluxo, para fins de análise detalhada das subpopulações linfocitárias:
Subpopulação de linfócitos (CD3, CD4, CD8, CD19 e CD56)
Exame básico que permite a distinção entre linfócitos T auxiliares (CD4⁺), citotóxicos (CD8⁺), linfócitos B (CD19⁺) e células NK (CD16⁺/CD56⁺).
Imunofet
Exame para avaliar o perfil de maturação dos linfócitos T (CD4 e CD8), desde os estágios naïve (imaturo) até células de memória central e memória efetora. É indicado na investigação de imunodeficiências celulares, como na suspeita de SCID ou em crianças com infecções recorrentes por fungos, micobactérias ou HIV.
Imunofeb
Avalia a maturação dos linfócitos B, desde a forma naïve (imatura) até os linfócitos de memória com switch de classe. É útil na avaliação de pacientes com suspeita de imunodeficiências humorais, isto é, pacientes com alteração na produção ou função de anticorpos circulantes, mesmo com número absoluto de células B aparentemente normal.
Esses exames complementam a análise imune, principalmente em pacientes pediátricos ou em situações de imunodeficiências congênitas ou adquiridas, fornecendo dados mais detalhados do que a simples quantificação celular.
Como interpretar a quantificação das subpopulações de linfócitos?
A interpretação da imunofenotipagem deve considerar o contexto clínico e as variáveis fisiológicas do paciente, como idade, uso de medicações e presença de infecções. A seguir, listamos os principais achados por tipo celular.
Linfócitos T (CD3⁺, CD4⁺, CD8⁺)
A redução dos linfócitos CD3⁺ pode sugerir SCID, síndrome de DiGeorge ou infecções crônicas. A ausência completa dessa subpopulação em crianças pequenas é altamente sugestiva de SCID clássico, requerendo avaliação genética imediata.
Valores reduzidos de CD4⁺ são observados em infecção pelo HIV, imunodeficiências combinadas e uso crônico de imunossupressores. Já a depleção de CD8⁺ pode ser vista em infecções virais crônicas ou deficiências imunológicas específicas. A inversão da razão CD4/CD8, em particular quando associada à ativação crônica do sistema imune, deve ser monitorada em doenças autoimunes e infecções persistentes.
Linfócitos B (CD19⁺)
A ausência ou redução significativa de CD19⁺ é indicativa de agamaglobulinemia ligada ao X. Quando o número de CD19⁺ está preservado, mas há falha na produção de anticorpos, deve-se pensar em imunodeficiência comum variável (CVID). Em doenças autoimunes, como o lúpus, observa-se frequentemente um aumento de linfócitos B ativados.
Pacientes sem células B funcionais requerem terapia de reposição de imunoglobulina humana, para prevenir infecções graves e garantir proteção imunológica mínima.
Células NK (CD16⁺/CD56⁺)
A redução numérica dessas células pode estar associada a infecções virais recorrentes, notavelmente herpesvírus. Para avaliar a funcionalidade (atividade citotóxica), exames adicionais são necessários.
Rendimento diagnóstico
Embora a citometria de fluxo ofereça uma visão detalhada do sistema imune, sua interpretação isolada não é suficiente. Por isso, é importante que os resultados sejam analisados em conjunto com dados clínicos, histórico do paciente e outros exames laboratoriais e genéticos.
Algumas variáveis podem interferir nos resultados, como o uso de corticosteroides e imunossupressores, que alteram a contagem linfocitária. Infecções agudas, especificamente as virais, também podem modular temporariamente a distribuição das subpopulações. Variações fisiológicas relacionadas à idade devem ser consideradas, especialmente na infância e senescência.
De modo geral, a precisão diagnóstica da metodologia é inquestionável, sendo considerada padrão-ouro na imunofenotipagem. Com a citometria de fluxo, é possível não apenas quantificar, mas também compreender o perfil de maturação e ativação das principais células do sistema imunológico. No entanto, o uso deve ser estratégico, dentro de uma investigação clínica robusta e multidisciplinar.
Para aprofundar seu conhecimento sobre imunologia laboratorial, recomendamos a leitura do conteúdo: Como aplicar testes imunohematológicos.
Referências:
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