O uso racional de medicamentos é um conceito importante para garantir segurança, eficácia e qualidade no cuidado com a saúde. Apesar disso, a prática da automedicação ainda é extremamente comum no Brasil e no mundo.
Dados do Conselho Federal de Farmácia (CFF) apontam que mais de 77% da população brasileira admite tomar medicamentos sem orientação médica, o que representa um risco significativo para a saúde pública.
Além de comprometer a eficácia dos tratamentos, a automedicação pode gerar efeitos adversos, intoxicações e até mascarar sintomas de doenças mais graves. Outro ponto de alerta é que muitos desses medicamentos, quando utilizados de forma incorreta, podem interferir nos resultados de exames laboratoriais, levando a erros de diagnóstico e de conduta médica.
Neste conteúdo, você vai entender melhor sobre o que é o uso racional de medicamentos, os perigos da automedicação, como isso pode impactar seus exames e sua saúde, assim como a importância de seguir as orientações médicas, especialmente em tratamentos de longa duração ou com medicamentos controlados.
O que é o uso racional de medicamentos?
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso racional de medicamentos consiste na prática de prescrever, dispensar e utilizar fármacos de forma adequada às necessidades clínicas de cada paciente. Ou seja, usar a medicação correta, na dose certa, pelo tempo necessário e com o menor custo possível, tanto para o paciente quanto para o sistema de saúde.
Essa prática é essencial para garantir que o tratamento tenha sucesso, evitando efeitos adversos, intoxicações, falhas terapêuticas e até agravamento de doenças. O uso racional de medicamentos ajuda, ainda, a reduzir custos, tanto pessoais quanto coletivos, e previne problemas como o desenvolvimento de resistência bacteriana, sobretudo em relação ao uso indevido de antibióticos.
Os perigos da automedicação
No Brasil, a automedicação é uma prática culturalmente disseminada e, muitas vezes, subestimada em termos de risco. Basicamente, sete em cada dez brasileiros já tomaram medicamentos por conta própria.
Ao se automedicar, a pessoa assume riscos sem ter conhecimento suficiente sobre o medicamento, sua ação, os efeitos adversos e as possíveis interações com outros fármacos ou condições de saúde.
Entre os problemas mais frequentes, estão as intoxicações, as reações alérgicas, o agravamento de quadros clínicos e o desenvolvimento de resistência, como ocorre com antibióticos. O uso de medicamentos sem necessidade também pode mascarar sintomas de doenças mais sérias, retardando o diagnóstico e o início do tratamento apropriado.
Vale lembrar que nem sempre o que funciona para uma pessoa serve para outra. Cada organismo responde de uma maneira, e apenas o profissional de saúde tem o conhecimento necessário para avaliar o quadro, indicar o tratamento correto e acompanhar possíveis reações.
A automedicação pode alterar exames laboratoriais?
Sim. Muitas pessoas desconhecem, mas a automedicação pode alterar os resultados de exames laboratoriais, gerando interpretações equivocadas e, consequentemente, condutas clínicas inadequadas.
Medicamentos de uso comum, como anti-inflamatórios, corticoides, antibióticos e até anticoncepcionais podem interferir em exames de sangue, urina e outros testes bioquímicos. Por exemplo, o uso de corticoides pode alterar a glicemia e os níveis de colesterol, enquanto anti-inflamatórios podem impactar exames de função renal.
Por essa razão, é fundamental informar ao laboratório todos os medicamentos em uso no momento da coleta. Essa comunicação também deve ser feita ao médico solicitante, que avaliará a necessidade de suspender temporariamente algum medicamento antes do exame ou, então, interpretará os resultados considerando as possíveis interferências.
Por que manter uma farmácia caseira é arriscado?
Ter uma “farmacinha” em casa, com medicamentos estocados — e muitos deles vencidos ou sem indicação atual — é um hábito comum. No entanto, medicamentos armazenados de forma inadequada podem perder sua eficácia, sofrer alterações em sua composição química e, em alguns casos, se tornar tóxicos.
Outro problema grave é a intoxicação acidental, principalmente em lares com crianças, idosos ou pessoas com limitações cognitivas. A presença de medicamentos vencidos ou não identificados aumenta consideravelmente esse risco.
Adicionalmente, o descarte incorreto de medicamentos — como jogá-los no lixo comum ou na rede de esgoto — pode causar impactos ambientais, contaminando o solo e a água.
A importância do retorno ao médico para a renovação de receita
Muitos pacientes, em particular aqueles com doenças crônicas, têm interesse em retornar ao médico com o foco em atualizar as receitas. O que não sabem é que o retorno periódico tem um papel relevante no cuidado com a saúde. O médico não apenas emite uma nova receita, como também avalia a evolução da doença, monitora possíveis efeitos adversos da medicação, ajusta doses quando necessário e, quando necessário, solicita exames laboratoriais para acompanhar se a medicação está fazendo efeito como esperado e não está causando danos ao organismo.
É exatamente por isso que a prescrição costuma ter validade limitada, como forma de segurança e garantia de que o paciente tenha reavaliações periódicas. Essa medida não é burocracia: é uma conduta segura e responsável, tanto para o médico quanto para o paciente.
Medicamentos controlados: como ainda se consegue sem receita?
Apesar das legislações rigorosas, ainda existem brechas que facilitam o acesso a medicamentos controlados sem a devida prescrição médica. A venda irregular pode ocorrer em farmácias físicas ou pela internet, fato cada vez mais preocupante.
Medicamentos como ansiolíticos, antidepressivos, opioides e psicotrópicos exigem controle rigoroso porque têm alto potencial de causar dependência, efeitos colaterais graves e, em casos extremos, até overdose.
O uso desses medicamentos sem acompanhamento médico representa riscos elevados para a saúde física e mental, além de configurar uma prática ilegal.
Como o Brasil promove o uso racional de medicamentos?
Em nosso país, existem diretrizes e políticas públicas que buscam promover o uso racional de medicamentos. A própria Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério da Saúde (MS) trabalham para incentivar práticas seguras de prescrição, dispensação e uso.
Entre as estratégias adotadas, estão:
- capacitação contínua de profissionais de saúde;
- incentivo ao uso de medicamentos genéricos;
- avaliação do número médio de medicamentos por prescrição, buscando reduzir o uso excessivo;
- monitoramento do uso de antibióticos e de injeções, que costumam ser superutilizados;
- criação de comissões de farmácia e terapêutica em hospitais e serviços de saúde.
Contudo, alguns desafios persistem, como a falta de estrutura em alguns municípios, carência de profissionais especializados e necessidade de ampliar ações educativas voltadas à população.
Como a população pode contribuir para o uso racional?
A responsabilidade pelo uso racional de medicamentos não é somente dos profissionais de saúde ou das autoridades sanitárias — ela também é do paciente e da comunidade.
Por falar em atitudes que fazem a diferença, podemos listar:
- evitar a automedicação, sempre buscando orientação médica antes de iniciar qualquer medicamento;
- evitar compartilhar medicamentos com outras pessoas;
- cumprir o que está prescrito, sem alterar doses ou horários por conta própria;
- armazenar os medicamentos de forma correta;
- descartar aqueles que estão vencidos nos pontos de coleta indicados, garantindo segurança para a saúde e para o meio ambiente.
Aliás, o cuidado com os medicamentos é uma extensão do cuidado com a saúde em geral. Adotar essas práticas significa proteger não apenas a própria saúde, mas também a saúde coletiva.
Para que esse cuidado seja realmente completo, é preciso lembrar que a saúde mental também merece atenção. Quer saber como fortalecer o bem-estar emocional, cultivar o autocuidado e viver com mais equilíbrio e qualidade? Preparamos especialmente para você um guia para sua saúde física e mental. Boa leitura!
Sabin avisa:
Este conteúdo é meramente informativo e não pretende substituir consultas médicas, avaliações por profissionais de saúde ou fornecer qualquer tipo de diagnóstico ou recomendação de exames.
Importante ressaltar que diagnósticos e tratamentos devem ser sempre indicados por uma avaliação médica individual. Em caso de dúvidas, converse com seu médico. Somente o profissional pode esclarecer todas as suas perguntas.
Lembre-se: qualquer decisão relacionada à sua saúde sem orientação profissional pode ser prejudicial.
Referências:
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